No Paraná, um casal conseguiu concretizar o processo de adoção mesmo após o falecimento da bebê, com apenas sete dias de vida. A decisão é da 11ª câmara Cível do TJ/PR que, por unanimidade, manteve sentença ao considerar que “não resta dúvida que o casal faz jus à adoção da criança falecida como filha, e ela merece conter em sua lápide o nome daqueles que realmente foram sua família, pelo exíguo lapso de sua existência terrena”.
História
Durante a gestação, a mãe biológica, alegando não ter condições de criar a criança, ingeriu medicamentos abortivos tentando interromper a gravidez, mas as substâncias aceleraram o parto e a menina nasceu com 23 semanas. Logo após o nascimento, a mãe biológica a entregou para adoção.
Como o grau de prematuridade e a chance de óbito da bebê eram consideráveis, quatro casais rejeitaram a adoção até que um casal decidiu adotá-la, sendo concedida guarda provisória. Porém, a criança faleceu dois dias após o início do estágio de convivência e sete dias depois de nascer, sem que o processo de adoção fosse concluído.
Mesmo após o falecimento, o casal quis concretizar a adoção, mas, a legislação trata apenas da possibilidade de adoção pós morte quando o falecido é o adotante, sendo omissa quanto à conclusão do processo diante do falecimento do adotando.
Vínculo afetivo
O juízo de 1º grau entendeu que não poderia ignorar a relação de afeto existente no caso concreto. O vínculo afetivo, segundo o magistrado, merece respaldo do Poder Judiciário e, mesmo que haja ausência de previsão legal a respeito da possibilidade de conclusão da adoção após a morte do adotando não significa a proibição de concretizá-la.
“Os requerentes batizaram a filha, fizeram seu sepultamento com a participação dos familiares e da comunidade onde vivem. Não há como explicar, quantificar a entrega desses pais, desta família, neste processo tão curto de adoção, muito menos negar que a vinculação existiu ou julgar que pelo tempo mínimo não pudesse existir”.
Para o magistrado, o falecimento da criança não finda o desejo dos pais adotantes em concretizar o procedimento de adoção, “diferentemente disso, terminar o processo de adoção para eles é concretizar o que de fato tiveram, uma relação de pais e filha, que, infelizmente não teve tempo de amadurecer, mas foi vivida intensamente, do modo que lhes foi permitido”.
Com o entendimento, o juiz decretou, em sentença, a finalização do procedimento de adoção pelo casal, mas o MP recorreu, alegando que a adoção não seria juridicamente viável devido à perda do objeto do processo e falta de previsão legal.
Ao analisar o recurso, a 11ª câmara cível do TJ/PR, por unanimidade, decidiu manter a sentença uma vez que “a manutenção do que restou decidido na origem, além de não versar sobre qualquer interesse patrimonial, não gera prejuízo a ninguém" e que não restavam dúvidas de que o casal faz jus à adoção e que existe vinculo afetivo entre os pais e a criança.
O que diz o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei 8.069/90, sobre a adoção após a morte?
Art. 42, §6º – A adoção poderá ser deferida ao adotante que, após inequívoca manifestação de vontade, vier a falecer no curso do procedimento, antes de prolatada a sentença.
O ECA permite que a gestante ou mãe manifeste interesse em entregar seu filho para adoção, antes ou logo após o nascimento. Confira o conteúdo da lei:
Art. 19-A. A gestante ou mãe que manifeste interesse em entregar seu filho para adoção, antes ou logo após o nascimento, será encaminhada à Justiça da Infância e da Juventude.
§1º – A gestante ou mãe será ouvida pela equipe interprofissional da Justiça da Infância e da Juventude, que apresentará relatório à autoridade judiciária, considerando inclusive os eventuais efeitos do estado gestacional e puerperal.
§2º – De posse do relatório, a autoridade judiciária poderá determinar o encaminhamento da gestante ou mãe, mediante sua expressa concordância, à rede pública de saúde e assistência social para atendimento especializado.
§3º – A busca à família extensa, conforme definida nos termos do parágrafo único do art. 25 desta Lei, respeitará o prazo máximo de 90 (noventa) dias, prorrogável por igual período.
§4º – Na hipótese de não haver a indicação do genitor e de não existir outro representante da família extensa apto a receber a guarda, a autoridade judiciária competente deverá decretar a extinção do poder familiar e determinar a colocação da criança sob a guarda provisória de quem estiver habilitado a adotá-la ou de entidade que desenvolva programa de acolhimento familiar ou institucional.
§5º – Após o nascimento da criança, a vontade da mãe ou de ambos os genitores, se houver pai registral ou pai indicado, deve ser manifestada na audiência a que se refere o § 1 o do art. 166 desta Lei, garantido o sigilo sobre a entrega.
§6º – Na hipótese de não comparecerem à audiência nem o genitor nem representante da família extensa para confirmar a intenção de exercer o poder familiar ou a guarda, a autoridade judiciária suspenderá o poder familiar da mãe, e a criança será colocada sob a guarda provisória de quem esteja habilitado a adotá-la.
§7º – Os detentores da guarda possuem o prazo de 15 (quinze) dias para propor a ação de adoção, contado do dia seguinte à data do término do estágio de convivência.
§8º – Na hipótese de desistência pelos genitores – manifestada em audiência ou perante a equipe interprofissional – da entrega da criança após o nascimento, a criança será mantida com os genitores, e será determinado pela Justiça da Infância e da Juventude o acompanhamento familiar pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias.
§9º – É garantido à mãe o direito ao sigilo sobre o nascimento, respeitado o disposto no art. 48 desta Lei.
§10 – Serão cadastrados para adoção recém-nascidos e crianças acolhidas não procuradas por suas famílias no prazo de 30 (trinta) dias, contado a partir do dia do acolhimento.
O processo tramita em segredo de Justiça.
Fonte: TJPR