A Lei 12.318/2010 ou Lei de Alienação Parental completou dez anos
nessa quarta-feira (26/8). Segundo a legislação, considera-se ato de
alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou
do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós
ou pelos que tenham a criança ou o adolescente sob a sua autoridade,
guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao
estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.
O objetivo principal da lei é tutelar sobre os casos de alienação
parental, identificar o alienante, prezando sempre pelo melhor interesse
da criança e seu bem-estar. A psicóloga Nathália Della Santa, do Centro
de Apoio Psicossocial (CAP) do Tribunal de Justiça de Pernambuco
(TJPE), especifica quais os comportamentos mais repetitivos que
configuram a prática no dia a dia.
“Um dos comportamentos mais comuns é falar mal dos pais na frente dos
filhos. Além disso, impedir ou dificultar o contato entre pais e
filhos. Essas condutas podem aparecer de uma forma muito explícita ou
sutil. Também são ações corriqueiras dificultar o exercício da
autoridade parental, omitir informações importantes sobre a vida da
criança, como as relacionadas à saúde e à vida escolar, ou mudança de
endereço, além de induzir a criança a reconhecer o novo companheiro ou
companheira como pai ou mãe, na tentativa de substituição desses
papeis”, afirma.
Segundo a psicóloga, para identificar que a criança está sendo vítima
de alienação parental é preciso ficar atento a alguns sinais inseridos
na dinâmica familiar. “Normalmente é possível perceber que a criança
está vivenciando o fenômeno da alienação quando ela começa a apresentar
alguma recusa no contato ou na convivência com um dos pais sem que haja
um motivo real para tal. Por vezes, a criança também evita falar de um
dos pais ou demonstrar afeto por ele na frente do outro. Um dos sinais
mais claros que existe um processo de alienação instalado é quando a
criança não apresenta ambivalência cognitiva e afetiva com relação a um
dos pais. Por exemplo, quando ela não consegue ponderar pontos negativos
e positivos, e apenas fala dos aspectos negativos e sentimentos
desconfortáveis, desqualificando qualquer afeto, cuidado ou momento
feliz por eles vivenciado. É como se houvesse um filtro de percepção no
qual apenas o que não é interessante é percebido e registrado pelo
filho”, observa.
Os danos mais comuns produzidos na criança que sofre alienação
parental, de acordo com a psicóloga, incluem ansiedade, depressão,
alterações no sono e\ou no apetite, baixa autoestima, rendimento escolar
reduzido, dificuldade de concentração, comportamentos agressivos e
dificuldade no manejo da raiva e outras emoções, além de isolamento e
retraimento social. Ela salienta também a possibilidade da repetição do
comportamento dos pais pelos filhos na fase adulta. “É importante
destacar que as crianças aprendem intensamente com o modelo e exemplo
dos pais. Por vezes essa experiência pode contribuir com a construção de
crenças disfuncionais referentes à conjugalidade e à parentalidade. Um
padrão de comportamento pode ser aprendido e repetido por essas crianças
quando adultas, ao ocuparem a posição de cônjuges e pais. Assim, pode
ser alimentado um ciclo de aprendizagem e perpetuação desses
comportamentos disfuncionais nas famílias construídas por eles no
futuro”, considera.
Nathália Della Santa atenta para a necessidade do casal que vive um
conflito trabalhar as emoções de forma consciente para tentar evitar a
alienação parental. “Num momento de divórcio ou rompimento conjugal é
muito comum a dificuldade de estabelecer diálogos não-violentos e
manejar conflitos. São fases em que as emoções estão mais intensas e o
sofrimento comumente dificulta a distinção entre a conjugalidade, que
está terminando, e a parentalidade, que permanecerá. Indico fortemente
que os casais que estão pensando em se separar, especialmente os que têm
filhos, procurem ajuda profissional para orientações adequadas com
psicólogos especialistas em família. Esse auxílio é importante tanto
para lidarem melhor com suas próprias emoções, como também para ajudar
no manejo da situação com os filhos. Melhor do que remediar é evitar o
problema”, pondera.
Caso não seja possível fazer esse trabalho preventivo, Della Santa
enfatiza a importância do acompanhamento psicológico da criança que
enfrenta essa realidade. “As intervenções terapêuticas e psicoeducativas
são recursos importantes para reversão do fenômeno e fortalecimento
emocional dos pais e filhos. Trabalhos de mediação e conciliação também
podem colaborar muito com o processo”, observa. Nesse contexto de ações
que podem ser efetivadas para ajudar uma criança que é vítima de
alienação parental, a psicóloga destaca também a relevância da atuação
dos professores, considerando que muitas vezes são os profissionais que
mais têm acesso à criança e à dinâmica familiar no dia a dia.
“A compreensão da importância da participação de ambos os pais no
desenvolvimento e na rotina da criança é muito pontuada pelas escolas.
Naturalmente os professores entram em contato de forma frequente com as
dificuldades das família, e, quando bem informados, podem auxiliar com
orientações claras e precisas sobre os impactos da alienação na vida dos
filhos. Além disso, é importante que as escolas fiquem atentas, em
especial com pais separados, que as comunicações e demandas de
participação na vida escolar dos filhos sejam feitas de forma
equivalente com os pais”, analisa.
Em época de pandemia pelo novo coronavírus, com o consequente
isolamento social e a distância forçada de um dos genitores dos filhos,
Della Santa aborda a necessidade do incentivo à comunicação virtual.
“Nesse período atípico que vivemos, a alienação parental pode se tornar
mais comum em virtude do distanciamento de um dos pais. Por isso, nesse
momento, frisa-se com muita ênfase que as restrições são referentes ao
contato físico, sendo absolutamente indicado que o contato virtual,
através de telefone ou chamadas de vídeo, seja preservado e estimulado
pelos guardiões”, salienta.
Justiça – Como na maioria dos casos, a alienação
parental ocorre durante o processo de divórcio e das disputas de guarda
pelos filhos, ou seja, durante a tramitação de processos judiciais, a
prática pode ser denunciada nos autos do próprio processo. Cabe ao
genitor que percebe estar sendo vítima, denunciar ao juiz e ao
Ministério Público para que estes adotem as providências previstas pela
Lei. Outra forma de inibir a alienação, é também por ação autônoma,
ajuizada com essa finalidade, quando não estiver em tramitação ação
entre o alienador e o genitor alienado.
O juiz da 1ª Vara de Família e Registro Civil da Capital, Clicério
Bezerra, explica que a partir do momento que a Justiça identifica a
alienação, deve instaurar um procedimento para apuração da prática. “O
processo deve ser encaminhado a uma equipe multidisciplinar – em Recife
quem atua é o Centro de Apoio Psicossocial (CAP) - para estudo do caso e
parecer psicossocial. Após, com base no parecer e ouvidas as partes e o
Ministério Público, o juiz declara se existe alienação parental e, se
for a hipótese, estabelece as medidas para proteger a criança de tal
prática. Estando evidenciada no início do processo, o magistrado pode,
de logo, adotar medidas para evitar o agravamento da situação”, revela.
Ainda, segundo o magistrado, a Lei 12.318/2010 trouxe ao Judiciário
mecanismos para enfrentar a alienação parental, coibindo-a de forma mais
efetiva. O magistrado enumera as punições: “No artigo 6º da lei foram
estabelecidas as seguintes medidas punitivas: advertência ao genitor
alienador; ampliação do regime de convivência familiar em favor do
genitor alienado; estipulação de multa ao alienador; acompanhamento
psicológico ou biopsicossocial; alteração da guarda compartilhada ou sua
inversão; fixação de medida cautelar do domicílio a criança ou
adolescente; e até mesmo suspensão da autoridade parental”.
CAP- A principal atuação do CAP ocorre na
elaboração de estudos psicossociais em processos que tramitam nas Varas
de Família. Os juízes encaminham os processos que compreendem como
necessária a avaliação técnica da Psicologia e do Serviço Social. Quando
o processo chega ao CAP os profissionais da equipe realizam o estudo
dos autos, fazem entrevistas com as partes, familiares, com as crianças,
e, quando necessário, realizam visitas domiciliares e institucionais
para a elaboração dos laudos. Ao final da avaliação esse documento é
encaminhado à Vara de origem. A ideia é que esse estudo possa auxiliar o
magistrado, juntamente com outras provas, na sua decisão sobre o caso
em tela.
O Centro também realiza palestras para esclarecer dúvidas sobre o
tema em escolas, conselhos tutelares, e outros ambientes nos quais o
assunto esteja em pauta e realiza eventos nas datas comemorativas como
Encontros e Simpósios. A unidade possui também uma cartilha com as
informações mais relevantes sobre o assunto em parceria com a Assembleia
Legislativa de Pernambuco, o Conselho Regional de Psicologia de
Pernambuco e a coordenação acadêmica da DeVry Unifavip. A cartilha está
disponível por meio deste link, no site da Assembleia Legislativa do Estado.
Fonte: TJPE