Em entrevista à BBC Brasil, o especialista em Amazônia defendeu para a região o que chama de "desenvolvimento glocal": um modelo que atenda à crescente demanda do mundo globalizado por recursos naturais respeitando as populações locais e a sua relação com a natureza.

"Tivemos no passado um processo de depredação organizado sistematicamente pelo Estado, que transformou a Amazônia em uma lixeira de políticas públicas", afirmou.

"Nós sempre imaginamos que no subsolo da Amazônia há riquezas petroleiras e minerais, e há sim. Mas o que esses recursos geram são fluxos financeiros que não se traduzem em desenvolvimento, em reinvestimento produtivo sustentável."

No Equador, um país onde o petróleo - extraído da região amazônica - responde por um em cada dois dólares recebidos com exportações, o dilema é real.

O governo equatoriano tem buscado soluções para compensar a perda de receita caso proíba atividades de extração de petróleo em áreas protegidas, uma demanda freqüente entre comunidades indígenas que enfatizam sua ligação com a terra e a natureza.

"Há 40 anos começou a fluir petróleo da Amazônia. Já extraímos mais de 4 bilhões de barris, recebemos mais de US$ 82 bilhões em termos líquidos, e o desenvolvimento não aparece em lugar nenhum. O Equador não se desenvolveu, pelo contrário. Na Amazônia a situação é mais grave do que antes."

"A verdadeira riqueza da Amazônia é sua cultura, indígena ou mestiça, e sua biodiversidade. Só através da simbiose entre cultura e biodiversidade é possível aproveitar as riquezas regionais como estratégia de desenvolvimento", defende Alberto Acosta.

Recursos naturais

No Equador, as petroleiras estão aguardando para saber se o governo permitirá a exploração de petróleo no campo ITT, que fica no Parque Nacional Yasuní, uma área de proteção ambiental.

Os investimentos estão em marcha lenta até que a Constituinte presidida por Acosta apresente as novas regras do jogo, nos próximos meses.

O governo equatoriano diz que pode proibir a exploração em Yasuní se receber dinheiro em troca. Correa sugere um fundo internacional que garanta US$ 350 milhões ao Equador - o equivalente à metade do que o país estima que ganharia com a atividade petroleira no local.

O problema diz respeito ao Brasil porque a Petrobras é uma das interessadas na área. Em abril de 2007, a disposição para uma parceria com a estatal Petroecuador figura nos memorandos de entendimento assinados bilateralmente.

Mas na prática a indefinição tem mantido em suspenso os investimentos da Petrobras inclusive no campo 31, um bloco que fica na fronteira com Yasuní.

A única extração da Petrobras no Equador é realizada no bloco 18, e ainda assim a atividade é pequena - apenas 35 mil barris diários, em 700 mil barris diários produzidos no Equador.

"Somos muito firmes em lutar para que não se produza petróleo da Amazônia", afirma Alberto Acosta, para quem a extração de petróleo é apenas um aspecto da insustentabilidade do que considera um modelo extracionista aplicado na região.

"Por conta das atividades produtivas baseadas no monocultivo e da extração de madeira, a Amazônia tem índices de desmatamento enormes, de deterioro ambiental muito grande. Justamente nas províncias amazônicas, Sucumbíos e Orellana, se registram os maiores índices de pobreza do Equador."

Poder indígena

Em um livro escrito em 2005, Acosta reconheceu que seu discurso sobre a Amazônia mudou com o tempo.

De funcionário da PetroEcuador - "empresa à qual interessava e interessa, sem maiores preocupações ecológicas, maximizar a extração de petróleo na região", escreveu, fazendo um mea culpa -, ele se transformou em um dos mais duros críticos da atividade econômica na floresta.

O novo discurso acompanha as mudanças políticas no Equador, um país no qual a ascensão política da maioria indígena levou à eleição de presidentes que reivindicam soberania sobre os recursos naturais.

É o movimento étnico que encabeça, por exemplo, uma ação na Justiça que espera abocanhar da petroleira americana Chevron uma indenização de US$ 16 bilhões por danos ambientais causados pela Texaco - hoje sua controlada - em duas décadas de operação na Amazônia, entre 1972 e 1990.

Cerca de 30 mil habitantes da Amazônia alegam que foram prejudicados pela contaminação do meio ambiente e pela destruição do patrimônio cultural dos povos nativos. Espera-se que a sentença saia em 2009.

"Os camponeses e indígenas estão assentados em áreas que serão fortemente afetadas por modelos, digamos, extracionistas de matérias-primas", afirma Ricardo Carrillo, porta-voz do principal partido indígena do Equador, Pachakutik.

"O desenvolvimento econômico afeta muito os setores rurais e por isso uma das relações fundamentais do Equador tem de ser com o meio ambiente. Isso nunca foi tomado em conta."

'Maldição da abundância'

Acosta afirma que muitos países "estão dando um passo em direção ao 'neodesenvolvimentismo'". "É mais ou menos fazer o que se fez no passado: fortalecer o papel do Estado, impulsionar os mercados domésticos e forçar um crescimento econômico muito vigoroso", diz.

"Mas em outros países há os que estamos envolvidos com mudanças, e achamos que é preciso fazer diferente. Não é fazer bem o que se fez antes, e sim fazer coisas novas, que passam, por exemplo, pelo respeito à natureza."

Manifestado entre palavras cautelosas, existem temores latentes de que a expansão de países maiores, e em especial do Brasil - nação com "marcado neodesenvolvimentismo", no entender de Acosta -, signifique a apropriação dos recursos naturais de vizinhos em situação de desvantagem.

"Não quero usar um termo duro, mas poderia estar se constituindo na região uma espécie de subimperialismo, e isso não é bom para a região. Se há um país grande, que tem empresas transnacionais com práticas próprias e similares às dos países ricos, esse país não estaria dentro da lógica da integração (regional)."

Há cerca de um ano e meio no governo, a equipe do presidente Rafael Correa ainda tenta definir na prática o modelo de desenvolvimento do país - uma tarefa simbolizada pela própria Assembléia Constituinte presidida por Acosta.

Ele diz que quer pôr em prática no Equador um modelo de desenvolvimento "centrado no ser humano", que fuja da "benção" e da "maldição" que os recursos naturais significam para os países sul-americanos.

"Nós, como o Brasil, como a Argentina, como o Chile, somos exportadores de bens primários: cacau, banana, balsa, café, petróleo. Enquanto financiarmos nossas economias com esses bens naturais, não vamos nos desenvolver", diz Acosta.

"Estamos presos na maldição da abundância. Somos países pobres porque somos ricos em recursos naturais, e não aproveitamos nossas verdadeiras capacidades, nossa verdadeira riqueza, que não está nos recursos naturais, e sim no ser humano."

Fonte:http://verde.br.msn.com/artigo.aspx?cp-documentid=19303276